Relíquia de um futuro próximo: o que a inteligência artificial nos fará lembrar?
- Fernando S. Mendes
- 22 de mai.
- 3 min de leitura
Imagine o futuro não como uma linha adiante, mas como algo já embalado, arquivado, rotulado — pronto para ser lembrado antes mesmo de ser vivido.
Essa é a provocação visual feita pela imagem que dá título a este texto: “Relíquia de um futuro próximo”. Dentro de uma redoma de vidro, cuidadosamente posicionada numa estante entre câmeras analógicas antigas, vemos dois androides. Um deles segura uma câmera e se posiciona como fotógrafo, enquanto o outro — uma figura feminina metálica, elegante e altiva — posa com confiança diante de um pôr do sol futurista. Ao fundo, naves pairam no céu de uma cidade que parece saída de um filme de ficção científica.
A cena é ao mesmo tempo, poética e inquietante.

Um futuro que já é passado
A placa dourada na base da redoma chama atenção:
"Relíquia de um futuro próximo"
Essa frase carrega um paradoxo. Como algo do futuro pode já ser uma relíquia?
A resposta talvez esteja na velocidade com que estamos vivendo as transformações tecnológicas. O que hoje é inovação, amanhã vira obsolescência. E aquilo que ainda estamos tentando entender já está sendo documentado, estetizado, transformado em narrativa.
Estamos, de fato, vivendo um tempo em que o futuro acontece tão rápido que nos obriga a arquivá-lo antes mesmo de compreendê-lo.
A lente virou espelho
O robô com a câmera levanta uma questão provocadora: quem estará por trás das lentes no futuro?
Por séculos, a fotografia foi uma forma de contar histórias humanas — com alma, com emoção, com intenção. Mas se a inteligência artificial for capaz de capturar, compor e até criar imagens com técnica e sensibilidade, onde fica o papel do humano nessa cadeia?
E mais: a androide que posa com elegância sugere algo ainda mais profundo. Projetamos na IA não só funções, mas também ideais de identidade e beleza. A máquina passa a representar o que consideramos sofisticado, expressivo, desejável.
A IA está apenas nos imitando? Ou já está reinterpretando o que somos — e até quem gostaríamos de ser?
Documentar ou ser documentado?
O mais curioso é que, ao colocar essa cena em uma redoma, a imagem nos convida a ver o momento como um artefato histórico. Isso nos obriga a pensar:
O que queremos lembrar sobre essa era de transição entre o humano e o artificial?
O que estamos registrando com nossas tecnologias — e o que estamos deixando escapar?
Será que, no futuro, as máquinas olharão para nós da mesma forma como hoje olhamos para o passado analógico, com certo fascínio nostálgico?
A fotografia como metáfora da memória
A presença das câmeras antigas ao redor da redoma não é mero detalhe. Elas representam a memória, a captura do tempo, o desejo humano de eternizar momentos.
Colocar um futuro imaginado dentro de uma redoma, cercado por ícones do passado, é quase como dizer:
“Esse futuro que você teme ou admira… já está aqui. E já está virando lembrança.”
Uma pausa para reflexão
Essa imagem, criada com uma estética impecável e cheia de símbolos, é mais do que ficção científica. É uma metáfora sobre o agora.
Estamos na encruzilhada entre documentar e ser documentados. Entre criar e ser recriados. Entre lembrar e ser lembrados — talvez por entidades que nem sequer serão humanas.
A inteligência artificial já não é mais sobre "o que vai acontecer", mas sim sobre o que já está acontecendo.
E você? O que quer deixar como relíquia deste presente que já parece futuro?
Genial o texto, Parabéns, Fernando!!